quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Uma rua no meu passado

As rodas de meu carro delizavam pelo asfalto daquela rua. Tudo ali era novo, bonito, limpo e cheirava prosperidade. Na esquina, um suntuoso templo de uma igreja, cuja doutrina não se consegue saber pela fachada. No entanto, os jardins ao redor do palácio, um homem dourado -seria ouro?- em posição que lembra um esportista, mas acho que é uma anjo pois está tocando uma corneta, também de ouro, as portas, as janelas, o globo dourado em cima do qual está o tal anjo, os portões, o estacionamento cheio de carros do ano, tudo denota muita riqueza.
Olhei para a outra esquina e lá estava uma escola pública. Li o nome. Não acreditei. Meu Deus, ali eu iniciara minha vida de professora. Lembro que tinha de andar muito para chegar até ela. Nem vinha pelo mesmo caminho que agora podemos fazer, ruas foram abertas, bairros, aparentemente novos, nasceram. A rua era de chão batido e havia muitas casinhas dos dois lados. Naquele tempo, todas as crianças dos arredores estudavam naquele colégio. Arredores pobres, crianças pobres, casinhas pobres.
Estacionei e, antes de descer do carro, cerrei os olhos para tentar lembrar de alguns detalhes daquela época. Havia muita alegria! Gritaria de criança chegando para estudar, para comer a merenda, para receber o carinho dos professores. Vieram a minha mente diferentes momentos: o dia em que fechamos a rua - ninguém passava lá mesmo - para fazer uma festa ao ar livre, festa à fantasia; o dia em que enchi meu carro com as crianças da sala de especiais e as levei à Expointer; as vezes em que corria a colocar alguma criança que se machucara no carro e a levava a um Pronto Atendimento Médico que atendia nossos alunos, aceitando as carteirinhas do plano de saúde de algum filho de professor. Que fim levaram aquelas crianças? Onde foram parar as suas casinhas? Será que os que lá estudam agora se divertem como os de antigamente, aprendem como antes, recebem o carinho que, naquele momento me dei conta, dávamos a cada um deles, sujo ou limpo, são ou doente, esperto ou "burrinho"? Tudo está tão silencioso agora. Tudo está tão limpo. Tudo está tão organizado. Tudo está tão... frio.
Abri a porta do carro, saí, tranquei bem os vidros e a fechadura, acionei o alarme e fui dar minha aula particular. Mais de trinta anos se passaram, mas aquelas lembranças que haviam adormecido dentro de mim, acordaram e me deram muita alegria!

2 comentários:

  1. Lindo. Emocionei-me. Só faltou a banda... Pensei onde poderia ser este lugar.

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  2. Obrigada Sol!
    Este lugar é aqui em Porto Alegre, perto do Iguatemi! Quando ia lá há muitos anos se chamava "Morro da Guampa". Hoje os moradores de lá nem sabem disso!
    Mais uma vez obrigada por me seguir!

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