quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Nunca mais!

Nunca mais vou encontrá-lo na porta do prédio, sendo gentil e educado!
Nunca mais vou dividir o espaço do elevador com ele!
Nunca mais vou receber aquele cumprimento alegre e espontâneo!
Nunca mais vou esperar o outro elevador para deixá-lo subir acompanhado de sua bicicleta!
É isso que venho me repetindo desde que soube da tragédia. Ele estava na flor da idade, era trabalhador, lidava com pessoas, técnico em enfermagem. Tinha jeito para esta profissão. Era bondoso, solidário e prestativo. Ninguém tinha queixa dele.
Naquele dia havia me encontrado com ele, sem a bicicleta. Como sempre, perguntou se eu precisa de ajuda. Mais tarde, dizem, saiu de novo, à noite, com sua bike. Ela era nova, potente e elegante. Foi dar uma passeio, a noite estava bonita e pedia um giro pela cidade. Ao voltar, já em frente ao edifício, três desconhecidos o empurraram. A força foi tanta que ele e sua companheira foram jogados contra a grande porta de ferro, vermelha e de vidro. Seu corpo, braços, cabeça e tronco, foram arremessados, e os vidros que se quebraram com o impacto retalharam-lhe em diversas partes. O sangue jorrava enquanto ele se esvaía. Foi socorrido, levado ao Pronto-Socorro onde ficou por três ou quatro dias. Em coma. Durante uma cirurgia, tentativa de melhorar suas funções, teve uma parada cardíaca. Viveu mais um pouco, mas não resistiu. Se foi pra junto do Pai ontem, sem sua bicicleta, companheira inseparável, agora também toda lesionada.
Neste ano que está por terminar, mais um amigo se vai. Vai, Fabiano! Segura na mão de Deus e vai! Vou sentir saudades, vou sentir tua falta nos corredores de nosso prédio. Vai ser feliz! Obrigada por ter dividido alguns momentos de tua vida comigo.valeu, Fabiano!


Homenagem ao Fabiano, filho do zelador do prédio onde moro, que ontem deixou esta vida!

Eu queria ser uma árvore

Quando lecionava, no caminho para a escola onde eu trabalhava, num determinado trecho tinha de pegar uma ruazinha de apenas uma quadra que desembocava na ponta de uma praça. Nessa ponta havia uma grande árvore, um plátano! Seu tronco vigoroso e meio manchado inspirava-me uma segurança muito grande. Suas raízes agarravam-se ao chão como se tivesse certeza de que nada lhe tiraria dali. Dirigia meu carro com os olhos e o coração fixos nela. Aquele tronco nunca mudava, era estável, forte, inexplicavelmente, sábio! Sim, aquela árvore falava comigo todas as manhãs. Eu pedia que me ajudasse a ser tão poderosa quanto ela. E eu ouvia a resposta dela na energia que me passava. Engraçado, isso me faz entender como alguns povos veneram diferentes figuras e seres. Eu venerava aquela árvore!
Àquela hora da manhã, o sol começava a ascender e, justo ali, por trás da minha árvore, ele iniciava a estender seus raios que, dependendo da época do ano, abrilhantavam, de forma variada e magnífica, o esplendor da minha idolatrada. Dois momentos eram deslumbrantes: no outono, quando as folhas amarelavam-se e chegavam a assemelhar-se ao tom do astro rei, e na entrada do verão, quando sua copa estava repleta de folhas verdes, frescas, iluminadas, sadias, lindas!
E eu pedia a Deus que me desse a força daquele tronco e a beleza daquela copa, fazendo-me encantar a todos. Encantar não no sentido de desejar a apreciação de uma beleza, mas de provocar o encantamento naqueles que me rodeavam como aquele plátano fazia comigo.
Será que eu conseguia?

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Agonia de 26 de dezembro

Essa aí me leva! Tem jeito de quem gosta do meu tipo... O quê? Não acredita? Você sempre foi muito pessimista. Não vou me impressionar com suas palavras. Olha! A mulher parou. Upz, está me tocando. Vai me levar... Ai, só pode ser o seu olho grande. Desistiu. Mas eu não desanimo.
Hoje já são 26 de dezembro, e nós ainda estamos aqui, nesse gelo. Hi, lá vem o cara com aquela maquininha. Já vão mudar alguma coisa em nós. É sempre assim. E eu não consigo enxergar o que ele faz. Só sei que levo um susto danado toda a vez que ele aparece. Aquilo pra mim é uma arma.
Olha ali, amigo, lá vem outra senhora, ou melhor, senhorita e... bonitona!... O que que é? Não posso expressar o que sinto? Sai, você está sempre me criticando. Oh, oh... está chegando perto. Hum que cheirinho gostoso! Não acredito, está me apalpando!...Ai que saco! Agora apalpa você. O quê? Está te levando? Amigo, venha cá, não vai! Não me deixe sozinho.
Sou o último nesta prateleira fria. Ninguém me quis, ninguém me quer. Lá vem o cara da maquininha de novo. Será que vai baixar mais o meu preço mais uma vez? Descobri que é isso que ele faz. Não adianta, ninguém está a fim de mim... Ué? Aonde esse cara tá me levando? Passei no caixa, agora estou entrando no saco plástico. Maravilha! O cara da maquininha está me levando embora. Hum, não pegar táxi! Vou ter de me apertar no ônibus, mas pelo menos está ficando mais quentinho. Não vejo a hora de entrar num forninho bem quentão, ficar douradinho e, depois, ser bem enfeitado com abacaxi, cerejas e pêssegos. Só não estou a fim de aguentar aquela farofa! Que mania que as pessoas têm de achar que farinha frita combina comigo. Um peru da minha categoria deveria estar rodeado de purê de maçãs e geleia de amora seguido de uma belíssima taça de champagne francesa!

sábado, 25 de dezembro de 2010

Meu Natal

Houve um tempo em minha vida em que o Natal era festejado com a reunião de todos da minha família. Eu era pequena. Passávamos o mês de dezembro nos reunindo aos domingos na minha casa, afinal, eu era filha do avô de todos. Ensaiávamos músicas de Natal, meu pai no contrabaixo, minha mãe ao piano, uma de minhas irmãs no violino e todos, crianças e adultos, cantavam. Era lindo!
O presépio, que ocupava uma parede de quatro metros, era armado somente na véspera da véspera. Nele tinha tudo, grama, lago, patinhos, ovelhas, pastores, luzinhas, Nossa Senhora, São José e Ele, o Menino Jesus. A árvore batia no teto e era impregnada de enfeites e luzes, que piscavam muito, e eu ficava a cada ano, sempre muito encantada. Até hoje, o Natal é uma data especial pra mim. Pena que não é assim para todos!
Quando eu era criança, tudo era tão belo, tudo era tão pleno, nada estava fora do lugar, nada doía, nada fazia chorar, só o tombo da primeira bicicleta. Só o que assustava era a voz do Papai Noel, entrando no corredor lateral de nosso sobrado. Corríamos todos, juntávamo-nos e aquela vontade de fazer xixi, fazia com que nos segurássemos um ao outro. Nada podia dar mais medo do que a presença daquele velhinho, que, com os anos, todos nós descobrimos que era um de meus primos mais velhos. Hoje, quantos medos temos!
Onde está aquele Natal? Onde está aquela árvore? Onde está aquele presépio? Onde estão aquelas músicas? Onde está aquele clima de alegria, paz e amor? Sinto-me tentando juntar os pedaços perdidos ao longo da vida. Tentando agregar as novas aquisições, as novas ideias. Impossível, nada se assemelha! Só me resta guardar o meu Natal num canto bem escondido do meu coração, de onde ninguém possa tirá-lo, possa machucá-lo! Feliz Natal, meu Natal!