sábado, 5 de março de 2011

Viajando no twist

Outro dia, durante a aula de hidroginástica, o professor colocou uma sequência de músicas que realmente mexeram com minhas lembranças. Eram melodias e ritmos que me remeteram à minha adolescência. No momento da aula, senti-me na sala de visitas da casa onde me criei. Na época, era costume ter-se sala de jantar ou copa, lugar onde se faziam as refeições e sala de estar, onde havia sofá(s) e poltronas, um abajur de pé, normalmente com um belo tapete, uma mesinha de centro coberta por uma toalha de croché, em geral, feito pelas avós, e o toca-disco ou também chamado de eletrola. A nossa casa ocupava o andar de cima de um dos prédios da família, onde funcionavam, embaixo, uma loja de calçados, o escritório de meu pai e mais ao fundo a fábrica de caramelo dele. A sala de visitas ficava na parte da frente e tinha uma porta de vidro que dava para uma sacada. Como era bom ficar na sacada observando tudo o que acontecia na rua.
É final da década de cinquenta, minhas amigas estão na minha casa. Algumas na sala de visitas, outras na sacada. O lustre está com todas as lâmpadas acesas e, da vitrola, outro nome para o toca-discos, vem o som de uma música da época, qual é a música mesmo? Não sei! De repente, entra ali meu irmão mais velho, meio irmão, porque não é filho da minha mãe, é do primeiro casamento de meu pai que era viúvo quando conheceu minha mãe. Ele é bem mais velho que eu, mas é uma pessoa muito interessada nas modernidades que vêm aparecendo ultimamente. Traz nas mãos um disco. vem sorrindo, parecendo trazer com ele um tesouro. Gosta de novidades. Coloca o disco na eletrola, levanta bem o volume e olha para nós a fim de ver a reação. Meu Deus! É demais! Que ritmo! Que coisa mais louca, totalmente diferente do que a gente está acostumada a ouvir, a dançar! Ele, que já não é mais muito jovem, começa a dançar, sozinho, girando os pés sobre si mesmos, com as pernas meio abertas, o corpo balançando de um lado para o outro, ora flexionando um joelho, ora o outro, levando os braços alternadamente para frente e para trás. Como se movidas por uma onda contagiante, nós todas o seguimos e o imitamos. Que festa, que alegria!
Paul Anka, se não me falha a memória. Sim, dessa forma, fui apresentada ao twist, ritmo que vinha tomando conta das rádios americanas e que, depois, passou a fazer parte de todos os bailes da época. Lembro que, às vezes, todos os casais que dançavam bem juntinhos, ao ouvir os primeiros acordes e batidas do twist, separavam-se e começavam a dançar conforme meu irmão havia nos ensinado.
Ouvi risos e o professor me chamando. O exercício já havia mudado, e eu continuava no anterior, perdida em meus pensamentos. Perguntei o nome da cantor da música que tocava, mas o professor disse-me um nome que eu nunca havia ouvido falar. Com certeza, não conhecia Paul Anka, afinal, provavelmente ele nascera quando já nem se ouvia mais o twist. Que bom que cantores e músicos de agora estão resgatando esses sucessos de meu passado.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Mudanças de hábitos!

Pra quem eu vou comprar balas?
É isso aí! Estou passando por um problema, aparentemente bobo, mas que tem me perseguido desde que minha mãe partiu para não mais voltar para este mundo. Enquanto viva, não havia semana que não me "mandasse" comprar balas. Sim, ela me mandava, não pedia, inclusive, usava o dedo indicador erguido. Era até engraçado vê-la dando ordens como se eu fosse uma criança ainda. Ela, 95, e eu, 65. Quando a questionava se não estava comendo balas demais, ela dizia: "Elas roubam tudo! Não traz aquelas de chocolate, porque elas escolhem somente elas e me deixam as de banana.!" ELAS eram as enfermeiras e funcionárias da Casa de Repouso onde morava. No entanto, as moças que limpavam diziam que, pela manhã, havia, diariamente, muitos papéis de balas atrás da cama de minha mãe. Eu sei que era verdade porque quando morava aqui na minha casa, fazia o mesmo.
Esse problema se agrava na medida em que a lojinha de "1,99" onde eu comprava suas encomendas fica exatamente ao lado do prédio onde moro. Passo por ali e acho que tenho de entrar, comprar balas de mel, de banana, de chocolate, de iogurte!
Esse, com certeza, é apenas um dos hábitos dos quais terei de me libertar! Uns mais facilmente esquecidos; outros dificilmente abandonados.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Momentos de despedida: ela se foi!

Naquela tarde, ela fechou a boca. Não mais falou, não mais comeu. Se ouvia, não se sabia; se nos entendia, não demonstrava. Respirar já não conseguia sem o oxigênio salvador. A pressão arterial inconstante ia do alto ao baixo sem no equilíbrio se manter. Então, uma sonda foi colocada, e o alimento por ela enviado. Três dias assim ficou com o coraçãozinho a segurar sua vida neste mundo. Seus olhos não mais se abriram, devia já estar vendo paisagens mais bonitas do que um quarto de hospital.
Hoje para a UTI foi levada e dali talvez só saia quando sua missão estiver terminada. Nesse dia, vou agradecer pelo tempo que me permitiu com ela conviver.
(cont.)
Ontem ele parou, sim, cansou e parou!
Foram 95 anos de uma vida cheia de alegrias, doação, carinho, amor e fé!
Hoje dela nos despedimos, derramando as lágrimas de quem perde algo, mas felizes por ter dado a ela tudo o que mereceu!
Foi-se ao som de nosso canto, ao bater de nossas palmas!
Obrigada, mãezinha! És eterna em tudo que nos ensinou!
Segura na mão de Deus e vai!

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Medo? Imagina!

Ontem, feriado aqui em Porto Alegre em homenagem a Nossa Senhora dos Navegantes, tomei uma decisão sobre algo que vinha roendo minha cabeça e minhas pernas há bastante tempo. Enchi os pneus da bicicleta, coloquei-a no elevador e lá fui eu pedalar pelos caminhos, quase encantados, da nossa Redenção, para quem não conhece, Parque Farroupilha, dizem, o pulmão da cidade.
Há três anos atrás, quando vim morar neste bairro, um dos motivos que me fez optar por este apartamento, foi a proximidade com este parque. Além de todas as suas maravilhas, tenho também uma ligação sentimental com ele. Foi ali que, lá pelos meus oito anos, aprendi a andar de bicicleta. Durante um tempo de minha infância, meu pai, todos os domingos pela manhã, saía para passear conosco no seu Ford 51 e acabava chegando à Redenção. Ali, alugava uma bike, como dizem hoje, para cada um e nos acompanhava nos primeiros "passos" deste maravilhoso meio de transporte. Falei "nos" porque, apesar de ser filha única, cresci junto a meus sobrinhos, nasci tia, mas isto é outro assunto! Duvido que alguém tenha tido momentos mais divertidos e felizes do que aqueles nossos em meio a tombos e corridas.
Há dois anos e três meses atrás sofri uma cirurgia na coluna lombar. Foram colocados pinos e parafusos. Graças a Deus, estou ótima. Entretanto, havia uma frase do meu médico que não saía de minha mente: "Tu estás liberada para fazer de tudo, menos cair!" Aquele "menos cair" me acompanhou por todo este tempo. E realmente não deixava eu me soltar! Mas ontem disse um basta a este medo bobo, afinal, depois de mais velha, apenas caí uma vez da bicicleta.
Nossa! Que sensação maravilhosa! Conseguir ir mais longe em menos tempo, sentir o vento batendo no rosto, olhar tudo de um andar acima, passar das pessoas que caminham e o melhor, ouvir: "Que legal! Tu ainda andas de bicicleta! Não tens medo de cair?" e eu responder me achando: "Imagina, adoro! Que medo, que nada!"

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Ao meu neto mais velho!

Quando bem pequeno, quando recém chegara a este mundo, era indiferente!
Ao começar a fazer descobertas, falar, caminhar, estava sempre atento a tudo que se passava ao redor e era aberto a todo ensinamento. Eu tinha prazer em contar-lhe histórias, em dizer-lhe como as coisas funcionavam, corrigir-lhe o que ainda não fazia muito bem. Via nos seus olhinhos a admiração, o agradecimento, o carinho.
Chegou o dia em que ele viu que eu não era a única que sabia e ensinava-lhe. Comecei a sentir que tinha concorrente: a professora. O tempo que podia estar comigo já não era o mesmo. Tinha de ir à escola, tinha de fazer os temas, tinha mais amiguinhos. E eu ficando de lado, era assim que me sentia.
Agora entrou na adolescência, está um mocinho, está lindinho e charmoso! Parece que até uma namoradinha tem, mas não gosta de falar nisso, normal! Pouco vem na minha casa e, quando vem, isola-se na sala do computador e quase não fala com sua velha avó.
Não pensem que estou me queixando ou me achando abandonada. Não pensem que estou me achando injustiçada e considerando-o um ingrato. É uma vida amadurecendo, desabrochando e se preparando para a liberdade! E isso é lindo!
Engraçado, quando meus filhos passaram por esta fase, eu estava tão envolvida no meu trabalho e no empenho em dar a eles tudo que precisavam que as transformações foram acontecendo sem que eu notasse muito. Mas ser avó é poder assistir a esse espetáculo da vida como se assiste a uma peça clássica da dramaturgia universal, vendo algo deslumbrante, encantador, maravilhoso. No entanto, em certas partes dessa apresentação, derramamos lágrimas, afinal, tudo o que julgamos bom é porque emoção nos causou.
Vai, querido, vai viver a vida!

sábado, 22 de janeiro de 2011

Intrusos

Pegou a pinça e foi olhar-se no espelho de aumento que ficava em cima da cômoda no seu quarto. Antes de começar a tirar os pelos que a incomodavam embaixo das sobrancelhas, colocou-a no bolso do chambre e deu uma examinada minuciosa em seu rosto, puxando, nada delicadamente e com a ponta dos dedos, a pele, que não era mais a de quando tinha vinte anos. Puxava dali, puxava daqui, abaixava a cabeça, virava-a para a direita, depois, para a esquerda, levantava-a para analisar o pescoço. Foi nesse momento, que enxergou algo que não esperava: um cabelo comprido sob o queixo, enroladinho como um cacho. O que estaria ele fazendo ali? Como surgira? O que sinalava a sua presença? Devia ter crescido ligeiro, pois não havia se dado conta dele ainda. Está certo que não ficava, diariamente, observando sua face, seria dolorido demais. Aquele intruso, realmente, havia deixado nossa amiga desconcertada.
O que fazer? Arrancar a surpresa de maneira surpreendente de forma que nunca mais ela ousasse aparecer ali? Deixá-la em paz a fim de não crescer mais? Afinal, sempre ouvira dizer que quanto mais se depila mais se tem. Pegou o espelho que era portátil e dirigiu-se à janela, podia estar tendo uma visão. Quem sabe o tal cabelinho nem existia! Doce ilusão, lá estava ele, mais firme, mais visível e mais enroladinho do que antes.
Enfiou a mão no bolso, pegou a pinça e, com muita fúria, iniciou uma batalha para eliminá-lo. Levou algum tempo, seu rosto suava de nervosa, o que atrapalhava a investida sobre o inimigo. No entanto, sua raiva e medo eram tantos que venceu a parada. Seu queixo, agora, parecia a bundinha de nenê, lisinho, lisinho. E ali, perto da janela, com aquela luz imperdoável do sol, segurando com a mão esquerda o que não mentia, virou o rosto para a direita e, com a mão que sobrava iniciou novamente a analisar sua pele. Pra quê? Viu o que não queria ver: outro intruso! Talvez parente daquele, pois tinha as mesmas características. Olhou a paisagem pela janela e, num impulso, atirou o objeto revelador com toda a força. A sorte dela é que seu apartamento era de fundos e tudo que caia, caía sobre o telhado da garagem! Nunca mais quis examinar seu rosto!

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Aqueles dois!

O mar parecia pintado de tristeza. Sua cor deixava os olhos do espectador confusos uma vez que o céu era do mesmo cinza, revelando a sobra do fogo do um dia que fora intenso com as emoções daqueles dois.
Ela, loura, elegante, olhos lânguidos, pernas bem torneadas, boca rasgada e dentes pequenos. Ele, forte, pernas musculosas, olhar firme, boca grande e dentes muito brancos. A beira da praia permite que se tenha uma noção mais clara das características físicas dos seres, o que pode dar à primeira impressão um peso maior, não acham? E foi assim que eles se encontraram, ali, com as ondas refrescando os pés enquanto o coração queimava de paixão à primeira vista. Haviam passado um pelo outro, e o olhar rápido com o canto dos olhos os fez voltarem. Pararam tão perto que podiam sentir o cheiro que caracterizava cada um. E este os levou a achegarem=se mais e, assim, face a face, giravam como um carrossel ao som dos pássaros que voavam sobre os dois, ao calor do sol que aquecia-lhes os corpos, ao toque da água que, de tempos em tempos, vinha molhar-lhes. Não mais se afastaram. Andavam, corriam, olhavam-se. De longe, percebia=se que faziam juras de amor.
De repente, uma voz masculina, forte e imperativa é ouvida. Os nossos apaixonados param e, sem nenhuma explicação, o nosso varão sai correndo na direção de seu dono pois grito de pai qualquer um escuta.
Nossa loura sentou nas patas traseiras, vendo sumir o seu amado que entrara num carro vermelho. Na vidro traseiro, ela avistou aquele cão que conquistara seu coração. Do olho direito dela uma lágrima correu. Saiu andando, enquanto o céu ia trocando sua cor, o sol escondia-se atrás das nuvens cinzentas que tomavam conta de tudo, e o mar refletia a tristeza que tomava conta do coraçãozinho daquela Cocker cor de mel que pensara ter encontrado o amor de sua vida.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

LEVANTAR? PRA QUÊ?

Abri os olhos, estendi a mão e liguei o rádio. Aquela voz conhecida disse: “ sete graus, dia ensolarado, com ventos de.....! “. Desliguei o rádio, coloquei o braço para debaixo das cobertas e fechei os olhos. Virei-me para o lado direito, puxei mais as cobertas. Sair da cama pra quê?
Acordei meio assustada, acendi a luz de cabeceira e peguei o relógio de pulso que estava sobre a mesinha: nove horas! Lembrei-me, então, de que o rapaz da companhia telefônica viria ver o problema de conexão da Internet. Fiz alguns alongamentos, saí da cama, fui ao banheiro, sempre aos pulinhos para não sentir tanto o frio. Antes de sair do quarto, liguei o aquecedor; ao voltar, não foi difícil tirar o pijama e vestir a roupa. Era setembro! Por que tanto frio ainda?
Desliguei o aquecedor e abri a janela, mania de ter as peças da casa sempre arejadas. A visão diária de um paredão branco, muro dos fundos do clube do bairro, não era a mesma. Lá estavam cinco homens, mendigos. Uns sentados; outros deitados. Conversavam e riam. Claro que eu não entendia o que diziam, mas por um momento cheguei a questionar minhas irritações por não ter um aquecedor maior e mais potente, meu mau humor diante de certas agruras da minha vida. Aqueles cinco pareciam felizes somente com o calor do sol. Que força é esta que faz com que gente, em situação tão pior, consiga rir num dia frio, usando pouca roupa, talvez até sem alimento? O que é responsável pelo bom humor de alguém que não tem emprego, não tem casa, não tem roupa, não tem comida, não tem família?
Dirigi-me à sala e abri as janelas. Foi aí que vi dois homens bem vestidos, com bom sobretudo e boné de lã, aproximarem-se dos mendigos. Falavam e gesticulavam, enquanto as figuras de minha paisagem matutina mexiam-se, levantavam-se, alguns resmungavam, um outro tentava fazer com que todos se levantassem. Claro! Os homens bem vestidos estavam mandando saírem dali: não era bom para os negócios da empresa para a qual trabalhavam, só podia ser isto!
Uma das criaturas, no entanto, não tinha forças para se levantar, talvez por fraqueza ou pela bebida, porque, convenhamos, sem o conforto a que todos deveriam ter acesso, somente o sol e a cachaça! Enquanto este infeliz tentava sair daquela posição, um dos homens da empresa vai até perto de uma árvore, pega um dos galhos, que haviam sido cortados pelos funcionários da Prefeitura, e começa a bater no mendigo. Foi nesse momento, que uma força interior tomou conta de mim! Abri a porta da sacada e comecei a gritar: “Bater não! Por favor, não faça isso!” O homem ficou furioso comigo; disse-me palavras que não pude entender, mas parou. E o meu defendido, injustiçado deitou-se de novo, tranquilamente. Levantar?! Pra quê? Os outros já haviam sumido!
Aos poucos, aquela primeira impressão de que há pessoas que são felizes com tão pouco foi se modificando, e eu...


Nota: Acabei ligando para um número da Prefeitura que recolhe mendigos. A minha paisagem agora está vazia, só uma parede branca, limpa! Que bom para a tal empresa.