Abri os olhos, estendi a mão e liguei o rádio. Aquela voz conhecida disse: “ sete graus, dia ensolarado, com ventos de.....! “. Desliguei o rádio, coloquei o braço para debaixo das cobertas e fechei os olhos. Virei-me para o lado direito, puxei mais as cobertas. Sair da cama pra quê?
Acordei meio assustada, acendi a luz de cabeceira e peguei o relógio de pulso que estava sobre a mesinha: nove horas! Lembrei-me, então, de que o rapaz da companhia telefônica viria ver o problema de conexão da Internet. Fiz alguns alongamentos, saí da cama, fui ao banheiro, sempre aos pulinhos para não sentir tanto o frio. Antes de sair do quarto, liguei o aquecedor; ao voltar, não foi difícil tirar o pijama e vestir a roupa. Era setembro! Por que tanto frio ainda?
Desliguei o aquecedor e abri a janela, mania de ter as peças da casa sempre arejadas. A visão diária de um paredão branco, muro dos fundos do clube do bairro, não era a mesma. Lá estavam cinco homens, mendigos. Uns sentados; outros deitados. Conversavam e riam. Claro que eu não entendia o que diziam, mas por um momento cheguei a questionar minhas irritações por não ter um aquecedor maior e mais potente, meu mau humor diante de certas agruras da minha vida. Aqueles cinco pareciam felizes somente com o calor do sol. Que força é esta que faz com que gente, em situação tão pior, consiga rir num dia frio, usando pouca roupa, talvez até sem alimento? O que é responsável pelo bom humor de alguém que não tem emprego, não tem casa, não tem roupa, não tem comida, não tem família?
Dirigi-me à sala e abri as janelas. Foi aí que vi dois homens bem vestidos, com bom sobretudo e boné de lã, aproximarem-se dos mendigos. Falavam e gesticulavam, enquanto as figuras de minha paisagem matutina mexiam-se, levantavam-se, alguns resmungavam, um outro tentava fazer com que todos se levantassem. Claro! Os homens bem vestidos estavam mandando saírem dali: não era bom para os negócios da empresa para a qual trabalhavam, só podia ser isto!
Uma das criaturas, no entanto, não tinha forças para se levantar, talvez por fraqueza ou pela bebida, porque, convenhamos, sem o conforto a que todos deveriam ter acesso, somente o sol e a cachaça! Enquanto este infeliz tentava sair daquela posição, um dos homens da empresa vai até perto de uma árvore, pega um dos galhos, que haviam sido cortados pelos funcionários da Prefeitura, e começa a bater no mendigo. Foi nesse momento, que uma força interior tomou conta de mim! Abri a porta da sacada e comecei a gritar: “Bater não! Por favor, não faça isso!” O homem ficou furioso comigo; disse-me palavras que não pude entender, mas parou. E o meu defendido, injustiçado deitou-se de novo, tranquilamente. Levantar?! Pra quê? Os outros já haviam sumido!
Aos poucos, aquela primeira impressão de que há pessoas que são felizes com tão pouco foi se modificando, e eu...
Nota: Acabei ligando para um número da Prefeitura que recolhe mendigos. A minha paisagem agora está vazia, só uma parede branca, limpa! Que bom para a tal empresa.
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