terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Ao meu neto mais velho!

Quando bem pequeno, quando recém chegara a este mundo, era indiferente!
Ao começar a fazer descobertas, falar, caminhar, estava sempre atento a tudo que se passava ao redor e era aberto a todo ensinamento. Eu tinha prazer em contar-lhe histórias, em dizer-lhe como as coisas funcionavam, corrigir-lhe o que ainda não fazia muito bem. Via nos seus olhinhos a admiração, o agradecimento, o carinho.
Chegou o dia em que ele viu que eu não era a única que sabia e ensinava-lhe. Comecei a sentir que tinha concorrente: a professora. O tempo que podia estar comigo já não era o mesmo. Tinha de ir à escola, tinha de fazer os temas, tinha mais amiguinhos. E eu ficando de lado, era assim que me sentia.
Agora entrou na adolescência, está um mocinho, está lindinho e charmoso! Parece que até uma namoradinha tem, mas não gosta de falar nisso, normal! Pouco vem na minha casa e, quando vem, isola-se na sala do computador e quase não fala com sua velha avó.
Não pensem que estou me queixando ou me achando abandonada. Não pensem que estou me achando injustiçada e considerando-o um ingrato. É uma vida amadurecendo, desabrochando e se preparando para a liberdade! E isso é lindo!
Engraçado, quando meus filhos passaram por esta fase, eu estava tão envolvida no meu trabalho e no empenho em dar a eles tudo que precisavam que as transformações foram acontecendo sem que eu notasse muito. Mas ser avó é poder assistir a esse espetáculo da vida como se assiste a uma peça clássica da dramaturgia universal, vendo algo deslumbrante, encantador, maravilhoso. No entanto, em certas partes dessa apresentação, derramamos lágrimas, afinal, tudo o que julgamos bom é porque emoção nos causou.
Vai, querido, vai viver a vida!

sábado, 22 de janeiro de 2011

Intrusos

Pegou a pinça e foi olhar-se no espelho de aumento que ficava em cima da cômoda no seu quarto. Antes de começar a tirar os pelos que a incomodavam embaixo das sobrancelhas, colocou-a no bolso do chambre e deu uma examinada minuciosa em seu rosto, puxando, nada delicadamente e com a ponta dos dedos, a pele, que não era mais a de quando tinha vinte anos. Puxava dali, puxava daqui, abaixava a cabeça, virava-a para a direita, depois, para a esquerda, levantava-a para analisar o pescoço. Foi nesse momento, que enxergou algo que não esperava: um cabelo comprido sob o queixo, enroladinho como um cacho. O que estaria ele fazendo ali? Como surgira? O que sinalava a sua presença? Devia ter crescido ligeiro, pois não havia se dado conta dele ainda. Está certo que não ficava, diariamente, observando sua face, seria dolorido demais. Aquele intruso, realmente, havia deixado nossa amiga desconcertada.
O que fazer? Arrancar a surpresa de maneira surpreendente de forma que nunca mais ela ousasse aparecer ali? Deixá-la em paz a fim de não crescer mais? Afinal, sempre ouvira dizer que quanto mais se depila mais se tem. Pegou o espelho que era portátil e dirigiu-se à janela, podia estar tendo uma visão. Quem sabe o tal cabelinho nem existia! Doce ilusão, lá estava ele, mais firme, mais visível e mais enroladinho do que antes.
Enfiou a mão no bolso, pegou a pinça e, com muita fúria, iniciou uma batalha para eliminá-lo. Levou algum tempo, seu rosto suava de nervosa, o que atrapalhava a investida sobre o inimigo. No entanto, sua raiva e medo eram tantos que venceu a parada. Seu queixo, agora, parecia a bundinha de nenê, lisinho, lisinho. E ali, perto da janela, com aquela luz imperdoável do sol, segurando com a mão esquerda o que não mentia, virou o rosto para a direita e, com a mão que sobrava iniciou novamente a analisar sua pele. Pra quê? Viu o que não queria ver: outro intruso! Talvez parente daquele, pois tinha as mesmas características. Olhou a paisagem pela janela e, num impulso, atirou o objeto revelador com toda a força. A sorte dela é que seu apartamento era de fundos e tudo que caia, caía sobre o telhado da garagem! Nunca mais quis examinar seu rosto!

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Aqueles dois!

O mar parecia pintado de tristeza. Sua cor deixava os olhos do espectador confusos uma vez que o céu era do mesmo cinza, revelando a sobra do fogo do um dia que fora intenso com as emoções daqueles dois.
Ela, loura, elegante, olhos lânguidos, pernas bem torneadas, boca rasgada e dentes pequenos. Ele, forte, pernas musculosas, olhar firme, boca grande e dentes muito brancos. A beira da praia permite que se tenha uma noção mais clara das características físicas dos seres, o que pode dar à primeira impressão um peso maior, não acham? E foi assim que eles se encontraram, ali, com as ondas refrescando os pés enquanto o coração queimava de paixão à primeira vista. Haviam passado um pelo outro, e o olhar rápido com o canto dos olhos os fez voltarem. Pararam tão perto que podiam sentir o cheiro que caracterizava cada um. E este os levou a achegarem=se mais e, assim, face a face, giravam como um carrossel ao som dos pássaros que voavam sobre os dois, ao calor do sol que aquecia-lhes os corpos, ao toque da água que, de tempos em tempos, vinha molhar-lhes. Não mais se afastaram. Andavam, corriam, olhavam-se. De longe, percebia=se que faziam juras de amor.
De repente, uma voz masculina, forte e imperativa é ouvida. Os nossos apaixonados param e, sem nenhuma explicação, o nosso varão sai correndo na direção de seu dono pois grito de pai qualquer um escuta.
Nossa loura sentou nas patas traseiras, vendo sumir o seu amado que entrara num carro vermelho. Na vidro traseiro, ela avistou aquele cão que conquistara seu coração. Do olho direito dela uma lágrima correu. Saiu andando, enquanto o céu ia trocando sua cor, o sol escondia-se atrás das nuvens cinzentas que tomavam conta de tudo, e o mar refletia a tristeza que tomava conta do coraçãozinho daquela Cocker cor de mel que pensara ter encontrado o amor de sua vida.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

LEVANTAR? PRA QUÊ?

Abri os olhos, estendi a mão e liguei o rádio. Aquela voz conhecida disse: “ sete graus, dia ensolarado, com ventos de.....! “. Desliguei o rádio, coloquei o braço para debaixo das cobertas e fechei os olhos. Virei-me para o lado direito, puxei mais as cobertas. Sair da cama pra quê?
Acordei meio assustada, acendi a luz de cabeceira e peguei o relógio de pulso que estava sobre a mesinha: nove horas! Lembrei-me, então, de que o rapaz da companhia telefônica viria ver o problema de conexão da Internet. Fiz alguns alongamentos, saí da cama, fui ao banheiro, sempre aos pulinhos para não sentir tanto o frio. Antes de sair do quarto, liguei o aquecedor; ao voltar, não foi difícil tirar o pijama e vestir a roupa. Era setembro! Por que tanto frio ainda?
Desliguei o aquecedor e abri a janela, mania de ter as peças da casa sempre arejadas. A visão diária de um paredão branco, muro dos fundos do clube do bairro, não era a mesma. Lá estavam cinco homens, mendigos. Uns sentados; outros deitados. Conversavam e riam. Claro que eu não entendia o que diziam, mas por um momento cheguei a questionar minhas irritações por não ter um aquecedor maior e mais potente, meu mau humor diante de certas agruras da minha vida. Aqueles cinco pareciam felizes somente com o calor do sol. Que força é esta que faz com que gente, em situação tão pior, consiga rir num dia frio, usando pouca roupa, talvez até sem alimento? O que é responsável pelo bom humor de alguém que não tem emprego, não tem casa, não tem roupa, não tem comida, não tem família?
Dirigi-me à sala e abri as janelas. Foi aí que vi dois homens bem vestidos, com bom sobretudo e boné de lã, aproximarem-se dos mendigos. Falavam e gesticulavam, enquanto as figuras de minha paisagem matutina mexiam-se, levantavam-se, alguns resmungavam, um outro tentava fazer com que todos se levantassem. Claro! Os homens bem vestidos estavam mandando saírem dali: não era bom para os negócios da empresa para a qual trabalhavam, só podia ser isto!
Uma das criaturas, no entanto, não tinha forças para se levantar, talvez por fraqueza ou pela bebida, porque, convenhamos, sem o conforto a que todos deveriam ter acesso, somente o sol e a cachaça! Enquanto este infeliz tentava sair daquela posição, um dos homens da empresa vai até perto de uma árvore, pega um dos galhos, que haviam sido cortados pelos funcionários da Prefeitura, e começa a bater no mendigo. Foi nesse momento, que uma força interior tomou conta de mim! Abri a porta da sacada e comecei a gritar: “Bater não! Por favor, não faça isso!” O homem ficou furioso comigo; disse-me palavras que não pude entender, mas parou. E o meu defendido, injustiçado deitou-se de novo, tranquilamente. Levantar?! Pra quê? Os outros já haviam sumido!
Aos poucos, aquela primeira impressão de que há pessoas que são felizes com tão pouco foi se modificando, e eu...


Nota: Acabei ligando para um número da Prefeitura que recolhe mendigos. A minha paisagem agora está vazia, só uma parede branca, limpa! Que bom para a tal empresa.