sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Descobrindo a vida

Naquele dia, a porta estava aberta. Ela andou mais lentamente do que de costume, não sei se por receio ou por cautela. Foi! Foi para a rua e, assim que se viu fora de casa, deu-se conta de que tudo era novo para ela. Por que nunca a tinham levado além daquela porta? Passo a passo foi distanciando-se, batendo nas pessoas, indo sem destino, sem futuro e sem passado. Sua vida começava agora. O som dos carros a inquietava, mas ela tentava não se perturbar. Virava a cabeça e seguia seu instinto. Viu galinhas rodando dentro de uma caixa envidraçada.Chegou perto e sentiu o calor e o cheiro gostoso. Deu-lhe fome. Mas como se podia comer aquilo.Na casa dela nunca vira algo parecido. Resolveu seguir adiante. Quando se deu conta, seus pés pisavam em algo úmido e geladinho, ouviu gritos, parecia que a xingavam. Olhou para trás e viu a marca de suas pisadas na calçada, e homens começando a correr atrás dela. Correu, correu muito. Atravessou ruas no meio de carros, que não paravam, dobrou esquinas desconhecidas, passou entre pernas nuas e pernas vestidas, sentiu o vento em seus olhos e seu nariz gelou. Como vou voltar? Ela já não sabia voltar, estava perdida na estranha cidade. Viu árvores, deitou-se embaixo de uma delas, aproveitou a sombra. O sol já estava forte agora. Fechou os olhos e ali ficou sem saber o que fazer. Ouviu ruídos por perto, chegaram perto dela e sem trocar qualquer comunicação saiu andando ao lado deles, dos que faziam barulho, dos que faziam festa, dos que derrubavam latas, dos que tomavam água do lago, dos que se atiravam a rolar na grama. Ela finalmente descobriu a vida, finalmente conheceu os seus semelhantes, finalmente se encontrou. Para casa nunca mais voltou. Só corriam lágrimas de seus olhinhos quando lembrava de seus filhotes. Eram dois, um igual a ela, outro igual ao cachorro da vizinha, aquele safadinho do andar de cima, malcriado e fedorento.

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