terça-feira, 5 de junho de 2012

Coragem inesperada

Ela tinha quinze anos. Sempre parecera meio tímida, mas defendia com unhas e dentes os princípios em que fora educada. Todo dia, desde muito pequena, gostava de ser a encarregada de fechar a porta de veneziana da sala que dava para a sacada da casa. Dali tinha-se uma bela svista da rua. Lá pelas dez horas da noite, ela já de camisola, ia até a sala, abria a porta de vidro e com uma mão em cada bandeira da veneziana a fechava, certificando-se sempre se estava bem trancada, pois garantia, assim, a segurança da família. Porém, antes disso, curtia ficar alguns minutos espiando por entre as rendas da cortina da porta de vidro. Ficava no escuro, sem que ninguém a pudesse ver. Parecia que esperava ou tinha conhecimento de que algo poderia acontecer durante aqueles poucos minutos em que ela cuidava da sua rua. Do seu ponto de vista enxergava o prédio de um banco, não muito iluminado; uma casa de móveis, bem iluminada, mostrando mesas, camas, guarda-roupas, poltronas, tudo muito bem trancado por vidros e cortinas de grade; e uma joalheria, com vitrinas repletas de anéis de pedras preciosas, pulseiras de ouro, colares de pérola, óculos, e até vasos de puro cristal. Naquela noite, enquanto ali estava espreitando, viu um rapaz que caminhava de um modo estranho, olhando seguidamente para todos os lados. Isto a fez ficar em alerta. Ele foi, aos poucos, chegando pra perto da parede, passou pela loja de móveis, na mesma atitude suspeita, e já quase roçando as vitrinas da joalheria, foi até o fundo, deu uma parada, olhou de novo para todos os lados e deu uma estocada no vidro com algo que tinha na mão. Na mesma proporção em que os vidros caíam, nossa amiga, num impulso, abriu a porta e começou a berrar: "Pega ladrão, pega ladrão!" O rapaz levou um susto, olhou para ela, fez sinal "de banana" para ela e correu. Correu e sumiu. Os gritos alertaram o guarda do bairro que veio imediatamente, chamou a camburão, sim, naquele tempo, chamava-se camburão e ficaram cuidando da loja até o amanhecer. A garota foi dormir feliz por ter evitado um roubo e surpresa por sua coragem. Ao chegar da escola, ao meio-dia, aguardava-lhe um lindo presente do gerente da jolheria.

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