sábado, 7 de setembro de 2013

A espera (dois)

     Estou com medo.
     Foi isso que ela pensou antes de se despedir daquele quarto onde tinha passado os últimos anos de sua vida. Quando a colocaram ali, ninguém  lhe perguntou o que achava da decisão. O tempo passou, e as poucas visitas que recebia nos primeiros meses de seu isolamento, acabaram esgotando-se, e ela ficou só. Só com seus pensamentos, com suas sombras, com seus ruídos, com suas lembranças. Lembranças cheias de dúvidas e questionamentos. Por que estava ali? As chaves? Por que não tinha as chaves. Sentia-se fraca. O sol. Onde estava o sol? Quanto tempo ficaria ali? Por quanto tempo deveria esperar? Esperar por quê?
     Um dia vieram uns homens e abriram um buraco na grossa parede da torre do castelo e fizeram uma janela para ela. Uma janela com grades de ferro e vidros, os quais jamais foram abertos. Aquela janela passou a ser o mundo dela. Por ali ouvia o canto dos pássaros, por ali via as noites chegarem e os dias nascerem. Encantava-se com a chuva que molhava a copa das árvores que lhe enchiam de verde os olhos já cansados do marrom dos móveis velhos da reclusão. Apreciava, ao longe, os telhados das casas onde as pessoas da cidade viviam livremente. E ela imaginava o que cada um podia estar fazendo. Em seus sonhos acordada via casais se amando, crianças brincando, idosos arrastando pés, brigas, festas, tudo de que não mais participava.
     Hoje a porta se abriu. Ela avistou, primeiro, o assoalho brilhoso por onde agora arrastava os pés como os velhos de seus devaneios e, ao erguer com dificuldade a cabeça, avistou lá ao fundo o grande arco que a esperava. E soube. Dali teria a sua liberdade, dali abriria suas asas, dali sairia para nunca mais voltar. E foi assim que ela se foi e nunca mais voltou. Foi encontrar-se com os raios de sol, com os pingos da chuva, com o canto dos pássaros.

(Foto tirada num dos aposentos do Castelo de Edimburg na Escócia, em 2011)




Um comentário:

  1. Excelente! Admiro muito tua capacidade de ser concisa, essencial e poética. Talvez, minha juventude literária ainda não me permita escrever desta forma. Quero chegar lá e ler tuas narrativas tem-me ajudado muito.

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