terça-feira, 28 de agosto de 2012
Aquela voz!
Ele falava firme. Nem um tremorzinho. Sua voz era aveludada e grave. Ouvi-lo era um bálsamo para qualquer doença, física ou emocional. Construía suas frases dentro de uma sintaxe perfeita e sabia argumentar sobre todos os assuntos. No meio de uma conversa fazia digressões que demonstravam a pessoa culta que era. Fosse pela internet ou pelo telefone o seu jeito de colocar as ideias passava a segurança que tinha e que, com certeza, podia distribuir. Lembro que, uma vez, quando falava sobre um jogo de futebol, assunto que não me dizia muito, a partir do comentário sobre um passe de um dos jogadores, ele fez uma analogia com as mulheres que me deixou louca. Somente um homem de muita sensibilidade conseguiria enxergar tal relação. Aquilo me encantou! Outra vez, ao analisar um livro que acabara de ler, disse-me que o escritor usava as palavras como um pintor jogava as cores numa tela. Confesso que me perdi um pouco, afinal, o que ele queria dizer? O autor era bom ou ruim? Claro que fiquei quieta e continuei ouvindo. Não poderia decepcioná-lo com minha ignorância. Nunca nos encontramos, nunca revelamos detalhes de nossas vidas como a idade, por exemplo. Sabia que a cabeça dele já estava se adornando com o brilho de gotas de orvalho que indicavam a maturidade. Mas aquela voz denotava um cérebro infinitamente elástico, jovem, musculoso, perfeito.
Hoje vamos nos encontrar. Desde cedo estou feliz, exatamente como dizia o pequeno príncipe na obra de Saint Exupery. Como é incrível o ser humano! A emoção está presente em tudo e em todos os momentos, é só observar. Agora olho-me ao espelho e vejo as marcas da minha idade. Não tenho como escondê-las, nem quero. Passo o pó, ajeito as sobrancelhas e escolho o baton: vermelho ou rosa? Laranja, sim, o laranja combina com meus cabelos. Pego o carro, rodo a cidade até o local do encontro. Desembarco, dirijo-me ao centro do parque e sento-me no banco onde havíamos combinado de estar. Ele ainda não chegara. Por que eu sou tão pontual? De repente, ouço, atrás de mim, um som conhecido há alguns meses. Virei-me e o vi. Vinha sorridente, dizendo um poema de Drummond, com um buquê de flores do campo numa mão e, na outra, uma bengala. Seus joelhos não mais aguentavam o peso dos anos!
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