O verão
ainda não havia iniciado oficialmente, no entanto a temperatura já castigava os
moradores da cidade a partir das primeiras horas da manhã. Pedro e Laura haviam
se mudado para esse apartamento porque ficava mais próximo da empresa onde ele
trabalhava. Para Laura não fazia diferença onde morassem pois trabalhava em
casa, via internet. Porém o prédio não tinha a melhor posição solar, pegava sol
a tarde toda.
Eram sete
e quarenta e cinco da manhã de uma segunda-feira. Pedro estava na cozinha
fazendo o seu desjejum para sair para a produtora, onde era compositor, quando
Laura chega. Ela não dá um sorriso, não diz bom-dia. Para, estática à porta da
sala para a cozinha. Veste apenas uma camisola de cambraia bem fininha, através
da qual se consegue deslumbrar as curvas bem delineadas do corpo dela. Seus
ombros largos sustentam os braços alvos cruzados sob o busto. Seu rosto jovem e
lindo carrega agora traços de fúria, de quem não concorda com o que vê, de quem
não está acreditando no que acontece.
Pedro
repara na presença da esposa, estranha seu comportamento e tenta fazer com que
ela diga por que afinal está tão indignada àquela hora da manhã, mesmo antes de
trocarem o bom dia que sempre vem regado com muitas carícias e juras de amor.
Mas o que
se pode saber sobre o pensamento feminino? Como descobrir em que instante
fazemos algo que possa transformar a magia dos cafés das manhãs em segundos de
tensão, de insegurança, de desatino? Difícil, quase impossível poder prever tal
situação. E era nesse mar de incertezas que Pedro estava mergulhado. O que foi
agora? O que está acontecendo? O que eu fiz de errado? E imerso nessa tortura,
ele ouviu a voz que tantas vezes lhe declarara amor eterno.
─ Eu não
acredito, Pedro!
Diante dessas
palavras, o rapaz ficou mais estupefato. Ela não acreditava em quê? Do que ela
estava falando? Há pouco mais de meia hora ele escorregara para fora dos
lençóis que testemunharam delícias infindáveis de amor. Deslizara da cama de
maneira quase imperceptível a fim de que ela, Laura, continuasse o seu sono.
Lembra que parou em pé, ao lado do leito, olhando-a em silêncio. Como ele
gostava de observá-la assim, dormindo, calma. Ela, o anjo da vida dele. Ele
tinha certeza de que não fizera qualquer coisa que a pudesse deixar tão braba. Estaria
chateada por ele não ter levado o café para ela na cama? Mas Laura sabia que
nessa manhã ele teria de sair logo, pois teria uma reunião importante no
trabalho. Decidiu tentar amaciá-la antes de saber do que ela falava.
─ Ora,
meu bem! Não fique brabinha! Você quer que eu faça um sanduiche quente?
Essas
palavras a levaram a quase atacá-lo. Saiu da porta onde estava encostada e deu
passos pesados e carregados na direção dele. Tinha as mãos fechadas como se
fosse soqueá-lo. Chegando à mesa, apoiou-as sobre a toalha, dobrou o corpo e
falou quase tocando a face do marido. Falou, com os dentes cerrados, que odiava
sanduiches de manhã, ainda mais quentes! As palavras foram emitidas calmamente,
mas o tom era de fúria.
Ao deparar-se
com a cara de perdido do marido, ela gritou:
— Você
comeu a última banana! Não consigo passar sem banana no café da manhã. Meu
corpo precisa de banana! Minha mente pede banana! Para mim, não ter banana pela manhã é um caso
de vida ou morte, e nesse caso é de morte! A minha por não estar, pelo menos,
enxergando uma banana, e a sua por ter comido a minha banana. Há mais de três
anos que estamos juntos e isso me dá uma raiva muito grande. Como você ainda
não entendeu que não pode comer a última banana?
Pedro
ergueu-se, segurou-a pela cintura fortemente, colocou-a sentada na cadeira de
onde ele saíra, arrumou a cabeça dela bem retinha, ajeitou-lhe os cabelos,
colocou as mãos da esposa sobre a mesa e disse:
— Fique
bem quietinha, não chore, não grite!
Virou de
costas e saiu caminhando rumo à rua. Ouviu-se o bater da porta do apartamento.
Agora era
Laura que não entendia nada. Nunca vira Pedro com aquele tom de voz. Nunca vira
seu marido tão firme. O que ele iria
fazer? Aonde ele fora? Será que voltaria? Por um instante chegou a se
arrepender do escândalo que fizera por causa de uma banana. Porém em seguida
julgou bobagem esta atitude, afinal ele é que não respeitava suas pequenas
manias. Claro que tinha razão. Por que Pedro não pensava nela? Uma banana podia
não ter importância para ele, mas esse desejo dela era incontrolável. Desde
pequena, ainda na casa de seus pais, nem mesmo sua avó ou seu irmão menor
ousavam comer banana se houvesse apenas uma. Era uma questão de respeito, de
conhecimento e de aceitação do outro. Isso, era isso mesmo. Ela tinha razão!
Nesse
momento, Pedro adentra a cozinha coloca na mesa, bem em frente a Laura um cacho
de bananas e pergunta:
— Chega?
Laura
olha pasma para as frutas!
Pedro
sai, fecha delicadamente a porta do apartamento e vai trabalhar!
(Texto
escrito na noite do dia 02 de janeiro de 2014, em Capão da Canoa)
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